O Caçula deve ter sido um dos primeiros restaurantes que nos foi recomendado, quando começámos a receber sugestões de estaminés a visitar, enquanto cardume gastronómico. Por uma razão ou por outra (e, sobretudo, porque estivemos uns tempos em modo temático), só oito meses depois o fizemos: juntámos os já mais do que habitués RC, DB e IP aos repetentes JM e PG e fomos conhecer o estaminé sito no número 47 da Praça Carlos Alberto, mesmo à entrada da Rua de Cedofeita, à esquerda – que outrora existiu perto do Bolhão, de onde foram expropriados (segundo nos contou o gerente, no final).
Visto de fora, O Caçula é um restaurante tão discreto que quase passa desapercebido, não fora uma mini-esplanada no passeio de fronte. Trata-se de um edifício antigo e estreito, restaurado, de três andares, sendo que no rés do chão temos um balcão e a sala de não fumadores (mais pequena) e, em cima, a sala de fumadores, onde ficámos. A primeira coisa que destacaríamos n’O Caçula é a decoração: simples mas de bom gosto, contém pormenores inusitados, como o tecto da sala do primeiro andar, as paredes das casas de banho ou o jogo de luzes do balcão de cima. Interessante e aconchegadinho, tal como os sofás de pele macia ou as cadeiras, robustas e vintage (ou, pelo menos, a simulá-lo).
À nossa espera encontrava-se já o Azeite Alentejano com Vinagre Balsâmico, onde era suposto mergulhar o magnífico Pão de Mistura ou de Sementes que acabámos por comer quase inteiramente sozinho, de tão bom que era. Pedimos as bebidas (vinho maduro branco Três Bagos para três, finos para dois, copo de vinho tinto da casa para uma e cola zero para outra) e, depois de seleccionados os pratos principais, ainda fomos brindados com pão de sementes tostado com manteiga de alho, que marchou até só sobrarem migalhas, depois de ser repetido.
Na verdade, eis que surge o primeiro grande problema d’ O Caçula: os tempos do serviço. Na verdade, deglutimos todas as entradas (e mais houvesse…) porque estivemos à espera dos pratos principais bem mais de meia hora, o que é muitíssimo, se pensarmos que, quando chegámos, para além de nós, só havia duas pessoas, noutra mesa (depois mais duas mesas de dois foram ocupadas). Mas vamos a eles: mandámos vir Francesinha de Porco Preto para o JM, Plumas de Porco Preto com Batata, Azeitona e Espargos Verdes para a PG, Bolinhos de Soja Grelhados, Salada Quatro Folhas e Batata Crocante para a IP, Bife do Lombo Grelhado com Batata Salteada e Misto de Cogumelos para o AV, Lombo de Bacalhau em Cama de Grelos e Batata a Murro para o RC, Pizza Calzone para a DB e Polvo Braseado em Ervas Aromáticas com Migas de Legumes e Azeitonas para mim.
Outra das negativas que daríamos a este estaminé prende-se com a discrepância temporal com que os pratos foram servidos: primeiro a francesinha e as plumas, depois o bacalhau, os bolinhos, o bife e o polvo (e até aqui tudo bem, estávamos num primeiro andar e havia que contar com o tempo de transporte desde a cozinha, no rés do chão, ainda que a existência de um outro funcionário a servir pudesse ultrapassar a situação) e só depois, bastante depois, a pizza, o que fez com que, quando espetámos o garfo no que já estava na mesa (esperámos voluntariamente pelo momento em que a DB fosse servida para o fazer, mas não havia por que ter de tomar essa decisão), a comida já estivesse morna, o que não é simpático para quem gosta dela quente. A justificação que nos deram estava relacionada com a necessidade de ter de se confeccionar uma segunda calzone, porque a primeira teria rebentado no forno – e a verdade é que esta, embora tostada por fora, apresentava uma massa excessivamente mal cozida (em estado cremoso) por dentro, o que não agradou.
Quanto aos restantes pratos, a primeira coisa que salientaríamos é a apresentação: à excepção da francesinha (servida de modo absolutamente banal, como se quer) e dos bolinhos de soja (a quantidade de salada não permitiria milagres), tudo foi servido muitíssimo bem empratado. Os pratos são, antes de mais nada, bonitos – o que não é de somenos, porque o paladar não é o único sentido despertado por estas coisas do gosto pelo que se come. Para além disso, estava tudo muito bom: o bife era tenro e bem grelhado, os cogumelos que o acompanhavam deliciosos (o AV não come fungos, pelo que eu e a PG tratámo-lhes da saúde) e as batatas fabulosas – assim como as que vieram com os bolinhos de soja (estes muitíssimo bem cozinhados) , que a IP partilhou e estavam soberbas, fritas com a casca e com sal no ponto. O prato de polvo apresentava o molusco em belíssima forma: pern0cas grossas, saborosas e tenrinhas, sob uma cama de legumes a que pedaços de azeitona davam um sabor especial e um toque de vinagrete em fios gelificados acrescentava sabor. As plumas (cuja cama de batata também envolvia azeitonas e maravilhou a PG) corresponderam e o bacalhau também agradou.
Já a francesinha, que o JM escolheu mal lhe pôs a vista em cima, também não deslumbrou: na verdade, só se descortina que o bácoro que lhe deu origem não é de outra cor qualquer porque está escrito na carta. Por outro lado, não tinha linguíça nem salsicha fresca e o molho não apresentava ponta de piri-piri, facto colmatado pelo pedido de picante, que foi prontamente atendido. Em conclusão, nesta fase só a pizza, de facto, não conseguiu brilhar de todo, pese embora o seu aspecto enganasse.
E faltava-nos o remate de que nunca prescindimos. Elegemos, como sobremesas, três Quente e Frio de Chocolate com Tangerina (a fazer lembrar, aprioristicamente, os do Medit, que arrebataram seis dos sete convivas presentes), uma Rodela de Ananás com Geleia de Vinho do Porto, uma Panacotta à Moda do Chefe e uma Pizza de Chocolate e Amêndoa para duas. Comecemos pelo mais pedido e que mais expectativas levantava, o quente e frio. A verdade é que desiludiu: o aspecto do bolo era o de um pudim (e a consistência era essa, embora sem sabor, segundo a IP), ou de uma espécie de petit gateau ao contrário (avançou o AV), porque era mais sólido por dentro do que por fora. Era pouco doce e não primava pelo sabor, o que levou a que não fosse ingerido até ao fim por todos; já o gelado de tangerina não mereceu comentários de destaque e a cama de frutos vermelhos era, segundo o AV, dispensável. A rodela de ananás foi o que mais elogios obteve, ainda que a panacotta (servida com gelado de cogumelos, o que só soubemos a posteriori e depois de todos o termos provado e gostado porque, segundo quem nos serviu simpaticamente nos explicou, a alusão a cogumelos e a gelado, na mesma frase, afasta o apetite conservador nacional) também tivesse agradado. Já a pizza de chocolate e amêndoas (que consistia numa rodela de massa fina e estaladiça, barrada com Nutella e polvilhada com amêndoa em lascas) só cumpriu. A DB afastou-a no final da primeira fatia (precisava de três vezes mais Nutella, no seu entender, para cativar e eu subscrevo) e eu só lhe tratei da saúde porque sem doce não sou gente. Mas não maravilha e trata-se de uma sobremesa cuja relação qualidade/preço é sofrível.
No final, os cafés e a conta: 26,60€ a cada um (ou melhor, 27€, porque não tivemos direito a troco, vá-se lá saber porquê…) foi, quanto a mim, um valor demasiado alto para esta incursão (inflaccionada pelo consumo do vinho, de que costumamos prescindir, bem sei) – que não foi, de todo, negativa, mas também não constituiu uma experiência memorável, como outras, que já vivemos.
E é isto, Freguesia janota. Bons apetites, sim?