
Não sei há quanto tempo terá aberto o Flow, numa zona em que os novos estaminés (de gama média a alta, também) pululam loucamente, mas diria que talvez há um ano e picos – e desde então que o tenho na lista como um dos “a visitar”. A ocasião (sempre ao jantar) já esteve marcada, já foi pensada, mas acabou por jamais se concretizar, por razões várias que não interessam nadinha. O que importa é que acabou por se trocar o jantar por um almoço e é dessa experiência que aqui venho dar conta, hoje.
Note-se que o Flow tem sido um dos restaurantes-da-moda, embora nos últimos meses o protagonismo vá recaindo noutros, que entretanto foram abrindo (inclusivamente na vizinhança); e eu, que não tenho nada contra tendências, a verdade é que não me costumo deixar convencer por elas só porque sim – é que nestas coisas, como nas demais, há as que correspondem à fama e há as que nem por isso, pelo que prefiro sempre comer para crer.
Tudo isto para dizer que o que nos levou (a mim e à RV, a minha companhia nesta incursão) a escolher o Flow foi, antes de mais nada, a localização (porque nos dava jeito, naquele dia) e, depois, a hipótese de, por 14€ (e não os 12€ que constam da Zomato, cumpre-nos avisar), podermos degustar pelo menos uma entrada e um prato principal, o que nos permitiria aferir se valeria a pena continuar a pensar num jantar, em que o valor final seria muitíssimo mais alto.
E permitam-me começar pelas primeiras impressões, que foram as mais fortes e perenes: o espaço é es-pe-ta-cu-lar. Lindo. Dos mais fantásticos em que esta vossa serva já entrou, seja enquanto Carapau seja à civil. É coisa para valer a pena pagar e não comer nada, que aquilo parece arraçado de monumento, tanto no que diz respeito ao que foi aproveitado no pátio, como no que toca à decoração que, desde o átrio ao bar e à sala principal é de um bom gosto irrepreensível: os azulejos no chão, as madeiras, os recantos em estilo árabe, os candeeiros que pendem do teto, as cadeiras à entrada, o piano de cauda, a luz, os apontamentos de clorofila – tudo tem a marca de quem sabe o que faz (e de quem aproveita o que de bom encontrou no edifício). Também o ambiente, ainda que descontraído e eclético (havia profissionais em intervalo de almoço, turistas, gentes de faixas etárias variadas), é requintado sem esforço (bem sei que é uma redundância porque nenhum requinte que mereça o epíteto será forçado, mas permitam-me a liberdade cronista), o que merece outro aplauso.
Ora portanto, até à altura em que nos sentámos na mesa, conduzidas por um funcionário que nos deu a escolher entre a sala principal e o pátio (e aconselhando-nos este último, já que a canícula não era muita e o espaço é de facto muito convidativo, sobretudo de dia), estávamos encantadas com cada pormenor – e é bem possível que eu tenha passado por turista deslumbrada (ou tão só por deslumbrada, vá), já que tentei registar tudo quanto me foi possível.
Uma vez sentadas, foi-nos trazido o couvert por outra funcionária (cujo tratamento por “as minhas senhoras” não me cativou; exemplifico: “as minhas senhoras já escolheram?” – ná, não aprecio), que aproveitou para recolher os nossos pedidos. Dois apartes, para já: o couvert está incluído no menu mas não é nada de especial (apenas umas fatias de baguete e um pedaço de broa [bastante boa, esta, devo dizer] para imergirmos no azeite); depois, só nos foi apresentada a carta com o menu de almoço – o que não sei se é procedimento habitual porque àquela hora não se serve mais nada, se aconteceu porque temos ar de pindéricas. Fica a dúvida, senhores.
Pareceu-nos que o menu seria alterado diariamente, e o que oferece é simpaticamente diversificado: para entrada, poderíamos optar ou por Sopa de Agrião, Croutons de Pão de Milho, Areado de Avelã e Azeite Extra Virgem ou por 2 Unidades de Crepes de Legumes e Camarão. Mandámos vir um de cada e à primeira dentada apercebi-me de que teria feito melhor se tivesse optado pela sopa, que a RV gabou, já que os crepes eram banalíssimos e poderiam ter vindo de um qualquer take away de comida asiática (talvez com um molho agridoce menos bom, devo conceder).
No que toca aos pratos principais, a escolha é mais vasta: há prato de carne, prato de peixe, prato de salada, prato de risotto e menu de sushi (sendo que este pode ser composto de dez peças variadas ou, por mais 2€, de 12 peças de sushi com sashimi), o que é bem mais do que a comum oferta de menus de almoço – e é quase impossível não haver ali qualquer coisa de que se goste. Claro que o meu problema é o oposto: gosto de (quase) tudo e o difícil foi escolher. Acabei por optar pela Salada de Carpaccio de Bacalhau Fumado, Húmus de Grão-de-bico, Broa Frita, Tapenade de Azeitona e Cebolinhas em Balsâmico – e estava boa, soube-me lindamente, mas tenho de destacar os croutons de broa (absolutamente divinos) e dizer que o húmus não me encantou pela consistência cremosa fininha. A RV foi para o Bacalhau Confitado a 55ºC, Açorda de Espargos Frescos e Hortelã, Ovo de Galinha e Aros de Cebola – e este era daqueles que se come desde logo com os olhos; lindíssimo, bem empratado, super-apetitoso. Depois de degustado, concluiu-se que, estando a açorda (ovo incluído) uma especialidade, o bacalhau tinha claramente passado do ponto (os tais 55 graus), apresentando-se seco e chato de comer.
Acompanhámos tudo com água servida de jarros (pelo que não sabemos sequer qual a sua proveniência, o que me parece indigno para um estaminé da gama do Flow), que é a bebida incluída no menu de almoço; obviamente, poderíamos ter escolhido um qualquer vinho ou refrigerante, mas não o fizemos, mesmo porque ambas gostamos de água (e também porque não nos apetecia pagar mais por um refrigerante e o vinho está fora de questão, quando se trata de ir trabalhar de seguida). Pedimos os cafés (também incluídos), porque a única sobremesa disponível (Semifrio de Coco, Abacaxi Caramelizado Com Hortelã e Vidrado de Kima) não nos encantou de todo, pelo que julgámos desnecessário gastar os 3€ que acresceriam à conta, caso a quiséssemos.
No final, a conta foi trazida num tablet (o que é moderníssimo e tal mas é coisa que detesto, mesmo porque é impossível de fotografar como deve ser) por aquela que calculámos que fosse a Chefe de Sala, uma jovem descontraída e simpática que atenuou um nadinha a ideia que até ali construímos acerca do serviço: funcionários esforçados mas aparentemente com falta de treino específico (o que se via nos pequenos detalhes), o que nos pareceu pouco condicente com toda a beleza envolvente.
Em resumo: o Flow não me maravilhou, de todo, enquanto experiência gastronómica. Mas que é um belíssimo espaço para um jantar (e não almoço) especial, ai disso não duvido sequer por um minuto – e apetece-me voltar, mais não seja para conhecer o resto da ementa e para perceber se posso gostar mais do estaminé.
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