
Tratou-se de mais um convite da Zomato (andamos a ser mimadíssimos, não vamos negar) que, em parceria com o Galeria do Largo, um restaurante recentemente inaugurado na Invicta e sito no maravilhoso Largo de São Domingos, teve a gentileza de nos convidar para irmos conhecer o espaço e o que lá se come.
Na verdade, o edifício que acolhe o estaminé que é hoje protagonista foi, durante cerca de dois séculos, conhecido por lá albergar a vetusta e consagrada papelaria Araújo e Sobrinho; entretanto, em meados deste ano, o hotel Porto A.S. 1929 instalou-se por lá, sendo que ainda hoje o espaço do restaurante Galeria do Largo lhe serve como sala de pequenos-almoços – e quase me apetece ali marcar uma dormida só para ter o privilégio de pequeno-almoçar naquela sala que imagino cheia de luz, virada para uma das zonas mais bonitas (e actualmente mais dinâmicas) do nosso Porto.
Mais recentemente, como dizia, o restaurante abriu, sob a batuta do Chef Manuel Ferreira, que tivemos a honra de conhecer – mas já lá vamos. A sala de jantar (que albergará uma meia centena de pessoas, talvez mais) é um miminho em termos de aconchego e decoração, entre o clássico e o confortável, com um aparador/louceiro que me apeteceria trazer para casa, se tivesse sala onde ele coubesse. Também o serviço é encantador: todo ele assegurado por funcionários jovens e visivelmente formados em hotelaria (o que, perdoe-se-me o dislate, é quase sempre uma mais-valia, no que me diz respeito – e as excepções só confirmam a regra), assegura um acompanhamento educado e cumpridor de protocolos, sem ser excessivo ou descarrilar no constrangedor. De resto, não será por acaso que, a dada altura, éramos os únicos portugueses na sala: ali fala-se inglês tão fluentemente como o idioma-materno (e com pronúncia deliciosamente britânica, if I might add so).
Quando nos foi apresentada a carta com o objectivo de escolhermos um dos dois menus de degustação presentes (ambos a 25€, incluem entrada, prato principal e sobremesa), tanto eu como o TD sentimo-nos um nadinha perdidos: na verdade, tudo parecia tão apetecível que a selecção afigurava-se-nos assaz dolorosa. E foi justamente nesta altura que a visita do Chef à nossa mesa, com o intuito de nos dar a conhecer a sua filosofia gastronómica e apresentar a carta (o que fez com brevidade e simpatia, sem quaisquer laivos de estrela, daqueles que parecem afectar metade dos Chefs, nos dias que correm), se revelou de extrema ajuda: percebendo as nossas dúvidas, sugeriu que nos entregássemos nas suas mãos, que ele providenciaria no sentido de nos dar a provar o que entendesse melhor representar a sua cozinha. Preparando-nos para o repasto, escolhemos um tinto do Douro para acompanhar, e uma garrafa de água para temperar (vá).
A partir de então, da nossa boca só saíram grunhidos de satisfação e de louvor: desde logo, porque em vez de uma entrada, o Chef Manuel Ferreira decidiu enviar-nos duas (isso mesmo, uma para cada um), sendo que a primeira, o Ovo 65º Com Queijo da Ilha e Cogumelos, foi ali mesmo unanimemente eleita como uma das melhores coisas que já comemos – adianto que somos dois “queijeiros”, mas aquela cama de queijo da ilha derretido, com quadradinhos de pão torrado e cogumelos, onde boiava um ovo escalfado e encimado por um par de fatias quadrangulares de presunto, cortado fininho, foi, para nós, o auge da refeição. Não que a entrada seguinte, o Bacalhau Fumado com Tomate Bloody Mary e Beterraba, não estivesse divino (o peixe era óptimo e a mistura de sabores muito bem conseguida), mas o coração e o palato ficara-nos definitivamente amarrado ao ovo.
Nesta altura, devo dizer, já tínhamos o estômago mais do que satisfeito, sobretudo porque abríramos hostilidades com um belíssimo pão (o meu de sementes, o do TD branco) molhado num belo azeite traçado de vinagre balsâmico e orégãos, mas também porque as doses, embora gourmet, são bastante generosas. Ainda assim, não enjeitámos a oferta daquele que o Chef considerou ser o prato principal que mais nos agradaria (e que nem sequer constava dos menus de degustação, pelo que estamos imensamente gratos): Lombinho de Javali Com Spätzle, Chutney de Figos, Couve de Bruxelas e Bacon. Magnificamente empratado e, mais uma vez, em quantidade mais do que suficiente, foi um prazer provar a carne tenra e o contraste de sabores salgados e doces (logo nós, que nem sequer apreciamos as frutas em pratos principais), num conjunto harmonioso e muito bem conseguido.
As sobremesas já foram, por assim dizer, um sacrifício estomacal (porque estávamos mais do que cheios, na altura) – que do palato, porque o que se seguiu esteve à altura de tudo o mais. Desde logo, muitas palmas para o Fondant de Abóbora com Requeijão, que me encantou em absoluto; mas também a combinação de Chocolate, que incluía gelado sob cama de bolacha de cacau, um macaron (adivinharam, de chocolate!), musse de chocolate e um brownie maravilhoso, mereceu o nosso aplauso já rendido.
Em resumo? Saiba o nosso caríssimo Cardume que, se tivéssemos de escolher um restaurante para levar alguém especial, para uma refeição encantadora, num espaço carregadinho de bom gosto, não teríamos dúvidas: a nossa experiência foi fantástica e os bons apetites estiveram presentes do início ao fim.
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