Há já muito tempo que esta re-incursão no Ichiban estava para acontecer:  a minha primeira ida a este estaminé não correra tão bem como estava à espera mas desde logo ficara decidido que não me quedaria por uma primeira impressão menos boa sobre aquele de que se dizia ser o melhor restaurante japonês do Porto (o que não é assim tão difícil porque verdadeiramente japoneses há muito poucos, embora mais agora, quinze meses volvidos). E permitam-me que vos dê conta, brevemente, dessa primeira experiência, para que possam perceber como a segunda me agradou duplamente, não apenas pelo que comi. (Só me lembro dela tão vividamente porque a registei por escrito, como é óbvio; de outro modo, não me atreveria a aludir-lhe, que as memórias podem ser enganadoras.)

A primeira visita ao Ichiban foi muito desejada, do muito que nos haviam recomendado o espaço, por não se tratar do mais típico restaurante oriental (que tem uma mistura de cozinhas que deixaria os nipónicos loucos) mas de um restaurante japonês tout court, tem um chefe japonês (o que é uma raridade) e pratos japoneses quentes, de que se diz o melhor, também. Concomitantemente, a sua localização, ali mesmo na Rua do Brasil, frente ao mar, torna tudo ainda mais agradável – pelo que agarrámos em nós e tratámos de reservar e ir jantar, em Maio do ano passado.

Gostámos imediatamente do espaço, aparentemente pequeno mas acolhedor e muitíssimo agradável:  dividido em três pisos (sendo que, no rés do chão, há como que um meio piso abaixo), albergará certamente umas sessenta ou setenta pessoas, pelas minhas contas (que não garanto rigorosas). Extraordinariamente, apesar de ser um espaço pequeno, com pé direito muito alto, e de estar cheio que nem um ovo (de ambas as vezes que lá fui), não se ouvem as conversas das mesas alheias nem há aquele burburinho que nalguns restaurantes se torna insuportável, por melhor que seja a comida

No ano passado, havíamos reservado mesa com uns dias de antecedência (o que se revelou assisado, então como agora) e calhou-nos o piso superior, o mais agradável de todos, que nos permite uma visão privilegiada sobre a preparação dos pratos e sobre a avenida e o mar. Para além do mais, em cima, os assentos dividem-se entre sofás e cadeiras, o que torna tudo mais confortável e acolhedor. Os funcionários que estavam de serviço às mesas eram portugueses, o que tornou a comunicação mais fácil e rápida, para além de que, no piso de cima, cada mesa dispõe de um daqueles aparelhómetros com três botões que permitem, sem barulhos, chamar o empregado, pedir a conta ou cancelar qualquer das acções anteriores, o que é muito prático e elegante. Também as loiças são bonitas e originais, bem como os individuais e o modo como os pauzinhos são apresentados (já agora, estes são daqueles que não se desfazem nem partem por onde não devem, como seria de esperar): sem grandes armanços que, normalmente, estragam tudo, mas com pinta refinada.

O problema, nessa altura, foi mesmo (pasme-se!) o sushi. Levávamos a lição estudada de casa (ou melhor, levava a RV, que é a nossa ponta de lança nesta coisa do TPC gastronómico) e sabíamos já o que pedir, tendo em conta que não estávamos nas chafaricas habituais, em que 90 peças para três são mínimos facilmente atingíveis – aqui, os preços coibiam-nos de disparatar. Vai daí, optámos pelo menu Moroiawase, que é inteiramente da responsabilidade do chef (trata-se do vulgo freestyle): pedimos um sashimi pequeno (10 peças), um sushi grande (30 peças) e um sushi pequeno (10 peças) para três – tínhamos lanchado antes, a ver se travávamos os apetites vorazes e (sobretudo) gulosos.

Claro que, antes da chegada da encomenda, que demorou pouco menos de meia hora (o que só não custou a passar porque tínhamos bucho cheio e conversa para pôr em dia), fomos aliciadas com a entrada do dia (o simpático e solícito empregado que ficou encarregado da nossa mesa e de todas as do piso superior trouxe-nos os pratinhos já prontos, não havia como dizer que não), um salmão panado que estava absolutamente delicioso. Pouco depois, veio o sushi, em três travessas distintas, de acordo com o pedido feito: numa espécie de lousa maior, as trinta peças, num recipiente redondo mais pequeno, as dez e, finalmente, num prato de sobremesa, o sashimi.

E agora vamos lá ver se nos entendemos, antes que me chamem nomes e tal (podem chamar à mesma, mas não por este motivo): somos consumidores assíduos de sushi (de gamas de preço e qualidades diversas), mas sempre na óptica do utilizador, isto é, distinguimos os peixes mais comuns (o salmão, o atum, o robalo) e pouco mais, os outros descrevêmo-los de acordo com aquilo que nos parece e sem qualquer pretensão de rigor, está bom? Por outro lado, nenhum de nós é especialmente fã do sushi de fusão, que vem do Brasil, não do Japão, pelo que o facto de não haver qualquer vestígio de fruta nas travessas entusiasmou-nos; na verdade, pagar para comer sushi e aparecer-nos um pedaço de morango enrolado em arroz é coisa para nos enfurecer (mais a mim, vá, mas a elas também um bocadinho), sobretudo se em chafaricas que se fazem pagar bem. Ora estávamos num restaurante japonês, como um chefe japonês, pelo que o perigo das fusões estranhas estava afastado – vai-se a ver e somos umas absolutas conservadoras, no que toca ao sushi.

Posto isto, que dizer do que nos foi dado a degustar no Ichiban, em Maio do ano passado? Olhem, as peças mais clássicas, como os nigiris e makis, estavam fora de série, à excepção de um nigiri que foi servido com qualquer coisa muito próxima da cavala, ainda com um nadinha de pele (e uma escama, num deles), que não só não nos arrebatou como nos desagradaria, não foram os fiapos de lima que levava por cima, para disfarçar o forte sabor a peixum (expressão muito da minha avó M.). Infelizmente, este mesmo peixe era um dos protagonistas das poucas peças de sashimi pedidas, o que não melhorou o panorama porque, para além do sabor intenso, a textura não era das mais agradáveis, por se apresentar algo rija e fibrosa. Não que não estivesse tudo fresquíssimo, note-se, porque estava – mas aquele peixe não nos falou ao palato, decididamente (valha-nos a lima e o gengibre – especialmente bom, também este último). A questão é que o resto das peças não trouxeram nada de novo nem nos agradaram sobremaneira, e só por isso não amámos o Ichiban – não por falta de qualidade, não porque alguma coisa estava errada, mas sobretudo porque, para além da selecção de peixes não ser inteiramente do nosso agrado, as expectativas eram tão altas que sentimos que a montanha pariu um rato – o que, por 35,50€ (com sobremesa), não é propriamente simpático

[bctt tweet=”Ichiban, Porto – Duas Experiências, Uma Conclusão”]

Entretanto, a RV e o TD reincidiram primeiro do que eu (que tinha vontade de voltar mas nenhuma de ser desiludida de novo) e há muito que falavam em regressarmos, de modo a que também eu pudesse perceber que uma experiência menos boa não tem de ditar a reputação de um restaurante – e ainda bem que insistiram, porque depois de uma segunda incursão, agora em Agosto, a minha opinião mudou inteiramente.

Marcámos um almoço e, desta feita, ficámos no piso de baixo, algo de que gostei muito, porque nos dá uma perspectiva inteiramente diferente, sem perder o mar e ganhando aquele pé direito altíssimo na sua totalidade. Mais uma vez observei a elegância da decoração minimal e o ambiente simpático, calmo e aconselhado a maiores de vinte e cinco, a atirar por baixo (o que me agrada, devo confessar). Um dos empregados era, se a memória fotográfica não me falha, o mesmo que nos atendeu há um ano e picos atrás – e, se estiver certa, pareceu-me mais descontraído agora.

Optámos pelo menu de almoço, aquele que, por 16,75€, nos proporciona uma entrada, uma sopa miso, sushi e sashimi, uma bebida, sobremesa e café – tem sido este que os meus companheiros de mesa têm escolhido e gabado imensamente. E devo dizer que não falhou o que quer que fosse, do princípio ao fim: a entrada (beringela com carne picada) estava coisa tão boa que me saiu o inconsciente tenho-de-tentar-isto-em-casa (que nunca tento, mas a intenção ilustra o quanto gostei), a sopa miso quentinha e saborosíssima, o sashimi (oito peças de garoupa, salmão, carapau e dourada) estava fresquíssimo e de consistência óptima, e as dez peças de sushi estavam todas fantásticas, sem nada que lhes pudesse ser apontado, para além da qualidade e carisma. Na verdade, até o gengibre (que, quanto a mim, é um excelente indicador de qualidade) era boníssimo. Para beber, escolhemos o chá de arroz e chá verde (frio para mim, quente para a RV) e uma limonada (para o TD) e não deixámos fugir a sobremesa, que poderia ser ou gelado ou cheesecake de manga – escolhemos os três o último e não nos arrependemos, ainda que a base de bolacha fosse fraquinha e mole (o recheio e a cobertura compensavam).

No final, a sensação era de vitória: finalmente havia percebido a distinção e o que torna o Ichiban tão querido dos amantes de comida japonesa – continuo a preferir o Shiko (pela primeira vez consigo fazer um pódio, permitam-me que desfrute) mas não tenho quaisquer dúvidas em indicar o Ichiban como um dos sítios onde se têm muito bons apetites nipónicos.

Ichiban

Morada: Avenida do Brasil 454, Foz, Porto
Telefone: 226 186 111
Horário: Seg a Qui – 12h30 às 15h00 e 19h30 às 23h00 | Sex e Sáb – 12h30 às 15h00 e 19h30 às 23h00 | Dom – 12h30 às 16h00
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