Parecia impossível: passei ali dezenas, centenas de vezes, entre a meninice e a idade adulta e jamais me dispus a entrar. De resto, o convite partiu da mãezinha: que eu ia adorar, disse. Que merecia a pena escrever sobre aquilo, sublinhou. E eu, que sou uma fácil e, na verdade, tenho alguma vergonha de nunca ter entrado n’O Tripeiro (como noutros baluartes da gastronomia da Invicta), aceitei o desafio, pelo que pegámos em nós e, num daqueles dias de Primavera a piscar o olho ao Verão, lá fomos, aproveitando outros afazeres marcados para os lados da Baixa.

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A entrada quase passa despercebida (ou sou eu que já tomo o espaço como um dado adquirido, de tantos anos a vê-lo ali): quem desce Passos Manuel, ainda antes de chegar ao Coliseu, encontramos um letreiro de néon alto (à antiga) e, para lá daquela montra, um espaço enorme, capaz de albergar 250 pessoas, há mais de 70 anos – de resto, os vários prémios discretamente posicionados na parede, à entrada, servem como lembrança disso mesmo: estamos a entrar num estaminé carregado de história, emblema da cidade do Porto não apenas pelo nome mas pela cozinha e pelo modo de receber cada conviva como se estivesse na sua própria casa, de forma cerimoniosa e educada, como convém a um Senhor restaurante.

O Tripeiro celebrizou-se pela excelência da cozinha tipicamente nortenha em geral e portuense, em particular, pelo que a ementa é um desfile de coisas que apelam ao palato, só pelo nome. De todo o modo, não posso deixar de destacar a decoração, tradicional, popular, robusta, de qualidade: tudo está bem conservado, tudo foi cuidado para que alguém como eu sentisse ali, na sua primeira visita, a mesma carga simbólica de há décadas.

Os funcionários são condizentes com o ambiente: formais sem salamaleques, afáveis sem jamais sequer tocar a barreira do boçal, educados e treinados (se há coisa que me mexe com o sistema nervoso é aquela ideia de que qualquer um pode servir às mesas ou atender público) – numa palavra, impecáveis. Mais: há ali mescla etária: tivemos a sorte de ser recebidas por um jovem de vinte e poucos anos, com tanto jeito para a coisa como o outro senhor que, como o ouvimos dizer na mesa ao lado, tem já 32 anos de serviço – porque ali os clientes não são apenas servidos, há atenção e cuidado e palavras trocadas a propósito da comida ou do que quer que seja.

Antes de nos deixarmos entreter pelo couvert, composto por pão, broa e tostas caseiras, mais manteigas e azeitonas (boníssimas, estas), linguiça assada (que bem que soube!) e mini-salgados (croquetes, pastéis de bacalhau e rissóis), que dispensámos, preparando o estômago para o que aí vinha, escolhemos os pratos principais: seriam filetes com salada russa (que depois foi trocada por arroz de feijão, porque a salada de algum modo não podia ser servida) para a mãezinha e posta de vitela para mim (meias doses, pois com certeza, que aqui a Norte são sempre bem generosas).

E, minha gente, a fama d’O Tripeiro durante tantas décadas não é, de todo, vazia: o que sai da cozinha sustenta-a a cada dentada. Não provei os filetes e o arroz mas a mãezinha assegura que estavam divinos; já a posta de vitela, que pedi mal passada, vinha mesmo mal passada (e eu às vezes até já nem peço, porque sinto que na maior parte dos sítios servem-me o que lhes apetece) e foi-me servida (pelo empregado, evidentemente: estamos num restaurante tradicional portuense, não o esqueçamos) em cama de legumes salteados e acompanhada daquelas que serão provavelmente as melhores batatas assadas que já comi: cortadas em gomos, com carradas de cebola e alho e ervas e bem tostadinhas, davam uma refeição per se. A carne desfazia-se e, temperada só com umas pedrinhas de sal, não podia estar mais saborosa – pelo que lá fiz o “sacrifício” de a degustar até ao fim (mais uma vez servida pelo prestável e sempre atento funcionário), embora aquilo fosse dose para gente com mais vinte centímetros e mais vinte quilos do que eu.

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Embora já plenamente satisfeitas, o grande final era algo que fora estabelecido aquando do convite, pelo que lá mandámos vir o leite-creme – “mas só um, vais ver o tamanho daquilo”, dizia-me a progenitora, que me conhece a vasta capacidade estomacal. E tinha tanta razão: cada dose é uma espécie de mini-travessa de barro, carregadinha de um leite-creme feito e queimado na altura (vale a pena a espera de dez minutinhos) que me soube pela vida.

Em conclusão? O Tripeiro não é o típico restaurante onde se vai almoçar no intervalo do trabalho (salvo se for dia de festa): os 20€ por estômago pagos não são coisa que possa acontecer todos os dias, para a maioria dos bolsos lusos (que ainda se podem dar ao luxo de fazer refeições fora). Mas é daqueles que vale a pena ter em conta quando se quer comer comida portuguesa tão boa como a lá de casa (sendo que, para mim, o “lá de casa” remete sempre para a minha mãe e avós, nunca para a minha), a preço justo e com serviço em conformidade.

Se passarem pel’O Tripeiro, entrem. Verão que terão bons apetites.

Restaurante Tripeiro

Morada: Rua Passos Manuel 195, Porto
Telefone: 222 005 886 |
Horário: Seg a Sáb – das 12h00 às 15h00 e das 19h00 às 22h30 | Dom – das 12h00 às 15h00
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