A primeira vez que ouvi falar deste restaurante foi há já uns meses, num programa da RTP da série Viagem ao Centro da Minha Terra sobre Castro Marim. Claro que Cabanas fica em Tavira e não em Castro Marim mas é (também) no Noélia e Jerónimo, em Cabanas, onde vai fazer uma entrega, que Jorge Raiado, empresário ligado à flor de sal, fala das maravilhas daquela vila algarvia. E, aquando da vizualização desse programa (repetido no princípio de Setembro), ficou-me no goto o polvo trapalhão, servido em prato de barro e acompanhado de batata doce, pelo que não descansei enquanto não o situei, numa das vindas da praia – o que não foi difícil, uma vez que fica no rés-do-chão do edifício sito frente ao cais de embarque/desembarque do barco que faz a travessia da Ria Formosa para os veraneantes que assentam arraiais no aldeamento de Pedras da Rainha (como eu).

Coincidentemente ou não (e isto é um exercício de estilo, que nunca acreditei em coincidências, mesmo antes de a Margarida Rebelo Pinto ter feito a descoberta do século), no dia em que fui ao restaurante Pedro (vide posta anterior, por favor) e publiquei uma fotografia na página de Facebook dos Carapaus, o PC não só nos aconselhou “o Noélia” (como é mais conhecido) como recomendou um prato em especial. E fechou-se o negócio: a visita dar-se-ia no dia seguinte (o último, antes do regresso ao Porto) sem falta.

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Às seis e meia, saímos de casa: a caminhada levaria uns dez minutos, outros dez seriam gastos a ver as mesmas montras pela enésima vez e perto das sete lá estaríamos. O restaurante Noélia e Jerónimo (que também se diz cafetaria e pastelaria) fica no piso térreo do edifício Cabanas-Mar, ao lado de bares para-inglês-ver (cheios de antenas de televisão por satélite e dizeres em inglês, francês e alemão). Naquele dia, a selecção portuguesa de futebol sénior jogava uma eliminatória de apuramento para o mundial (e o Primeiro-Ministro anunciava novas medidas de austeridade, o que me levou a começar a jantar com 14 salários e a terminar a refeição com 13 – o que QUASE me tirou o apetite. Mas faltou o quase) e fomos sabendo da evolução dos resultados pelos berros/guinchos dos clientes das esplanadas  vizinhas, o que, não sendo agradável, sempre é informativo (já da comunicação do PM, só soube pelo iPhone, que a malta está de férias e não quer saber de chatices).

Restaurante Noélia | Vista para a Ria Formosa
Vista para a Ria Formosa

Rebobinemos: chegadas ao estaminé cerca das 18h50, pedimos uma mesa a um empregado novito com ar de skater que teimava em não nos prestar importância, demasiado entretido que estava a pôr a conversa em dia com um cliente habitual (primeiro ponto negativo). Depois de reparar em nós, permitiu que nos sentássemos onde nos aprouvesse, o que levantou outro problema: estando as mesas postas para 8 pessoas, era preciso individualizá-las – o que acabou por acontecer na maioria das outras situações e tornou a esplanada demasiado pequena para tanta gente (ouvíamos a conversa do lado como se estivéssemos sentados juntos) – segundo ponto negativo.

Já sentadas (e antes da invasão referida), pedimos a lista, que nos foi negada: as refeições só seriam servidas a partir das 19h e o máximo que o skater nos poderia servir era bebidas e entradas, se as entradas pretendidas fossem pão e companhia. Não sei se nesta altura (terceiro ponto muito negativo) dei uma gargalhada ou soltei uma rosnadela, porque faltavam cinco minutos para a hora-agá, mas ainda tive discernimento para argumentar que, se pedíssemos naquela altura, nunca seríamos servidas antes das sete, mas ele ripostou com uma verdade irrefutável (como o são todas as coisas estúpidas): não podia ser, porque ele só servia entradas e bebidas, o colega é que tratava dos pratos principais; e antes que eu mandasse vir o colega e depressinha, apressou-se a acrescentar que o colega só faria a sua entrada (suponho que triunfal) às sete, nunca antes.

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Estava eu já preparada para uma crítica terrível quando o skater se desfaz em desculpas acompanhadas de um sorriso enorme e a justificação de que as ordens são superiores e ele só pode acatá-las e que me traz já dois fininhos e umas azeitonas que são uma maravilha. E trouxe. E eu pus a crítica de lado quando dei a primeira dentada no pão e provei o paté de marisco e percebi que a manteiga de alho era caseiríssima e ele se desfez em desculpas outra vez. Ficou a crítica adiada, mesmo sendo a cerveja Sagres.

Restaurante Noélia | Cartas com migas
Cartas fritas com migas de tomate

Quando veio o skater II (seriam escolhidos pela pinta?), o dos pratos principais, já eu fumegava outra vez: as entradas já haviam marchado há muito e o rapaz insistia em ir a cada uma das mesas sem respeitar a ordem de chegada (fomos as quintas a ser atendidas e as segundas a chegar). Mas, mais uma vez, fui desarmada por um sorriso simpático e um sentido de humor interessante. Decidi que aquilo não era defeito, era feitio, e que mais valia relaxar e desfrutar, pelo que passámos às encomendas (que já sabíamos de cor, tanto tempo tivéramos a lista que o outro nos trouxera, depois das 19h, na mão): a mãezinha (a MAA)  não resistiu às cartas fritas com migas de tomate e eu, apesar de ter patinado um bocado, tão boa era a oferta, aceitei a sugestão do PC: pataniscas de polvo com arroz de coentros. Pedimos também uma salada mista e continuámos nos finos.

A partir daqui, caro Cardume, é só elogios: acreditem se quiserem (se não quiserem, vão lá comprovar, é opção melhor!) mas a Noélia cala-nos  a impaciência com tudo o que sai daquela cozinha.

As cartas, espécie piscícola até então desconhecida para esta vossa criada, são uma espécie de linguadinhos que se apresentaram em boa quantidade e a saber a fresco; as migas de pão, tomate e bocadinhos de pimento eram de comer e chorar (copiosamente) por mais e até a salada mista se revelou superior: o tomate sabia a tomate, a alface era tenra e a cebola macia, para além de que os bocadinhos de pimento vermelho que a temperavam, juntamente com o azeite vinagre e sal, lhe davam o toque de originalidade que normalmente falta.

Restaurante Noélia | Pataniscas de polvo
Pataniscas de polvo com arroz de coentros

Quanto às pataniscas, ainda que já bem recomendadas, surpreenderam pela positiva e mereciam uma ovação e das muito barulhentas: carregadinhas de pedaços do molusco (e cebola e salsa em quantidade, mas sem mascarar o elemento principal), eram isentas de qualquer resquício de gordura e, embora muitas (cada dose satisfaria duas pessoas de apatite médio), não sobrou uma para contar a história. E o que diz uma não-arrozeira deste arroz de manteiga com coentros?! Maravilhas. É divino e dei conta de quase metade (era mesmo muita quantidade), pareceu-me criminoso não fazer jus àquele sabor.

Nesta altura, já mais do que satisfeita, não quis saber das muitas pessoas que esperavam para ocupar os setenta a oitenta lugares do célebre restaurante e ainda pedi o bolo cremoso de chocolate, a fazer lembrar o de chocolate sem farinha da portuense Ribeiro – não me arrebatou mas cumpriu.

Cafés servidos e contas feitas, foram 17,60€ por cabeça, o que, apesar do serviço atabalhoado (mas simpático) me pareceu barato, perante o regalo que tudo nos causou.

Se passarem por Cabanas e quiserem ter muito bons apetites, não deixem de visitar a Noélia (porque o Jerónimo, soubemos a posteriori pelo PA e pela MMF, a quem recomendámos vivamente a visita, morreu ontem – e o restaurante estava, evidentemente, encerrado), que a senhora tem mãos de fada para a cozinha. Nós ficámos fãs e mal podemos esperar pela próxima ida para os Algarves, que há ali uma enorme ementa para explorar.

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